quinta-feira, 19 de novembro de 2009

De uma vez em que esperava o ônibus

Mau humor – estou para ir trabalhar. Jogo os olhos numa leitura de bolso enquanto espero o coletivo. À minha frente, um menino-espoleta, que julgo ter sete anos de meninice, enfileira, na carroceria de seu caminhão de plástico, alguns bois. Já já se chateia da boiada e inventa de inventar brinquedo em cima de uma mureta perto de mim.

– Desce daí, menino! – pede a mãe.
– Tem que dizer a palavrinha mágica! – propõe ele.
– Apanhar! – ela sugere.

Tomo o ônibus com o rosto mais macio e nem sei se aquele mau humor embarca comigo ou se me escapuli pelo caminho.

Novembro, 2009

Quando

Ao Eliamar
Quando a tristeza restar como consolação,
E dos olhos desfalecidos, o sonho vão.

Quando as gentilezas estiverem apreçadas nas prateleiras,
E a gratidão, caduca de desuso.

Quando a morte converter-se em lucro,
Como quem boceja,
Ou pestaneja uma estrela.
E o medo corroer-se em hábito,
E os hábitos verdades irrefutáveis –
Discursos prolixos,
Insídia sangrenta,
Vassalo sem fim.

Quando o bem for o mal,
E as vaidades virtudes.

Quando matarem os fetos.
Quando o afeto acabar.

Quando os caminhos travarem nova barbárie
E não houver mais terra,
Nem semente,
Nem horizonte,
Nem saída, nem esperança
E não restar nem grão de ilusão.

E, por fim, quando Deus esquecer a nossa prece
E Maria esquecer de Deus,
E Maria dos santos,
E Maria dos anjos,
E Maria de própria Maria, meu Deus!

Não será mais que imprescindível, providencial também,
Se quem de loucura enferma
Reivindicar nos sentidos
O sentimento mais puro,
Que mesmo o poeta não incluiu neste poema.
E Brade aos homens e supremos: O AMOR É IMPORTANTE, PORRA!!!

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Quem sou eu:

O que, em meio àquela roda punk, de repente embestou-se mirando a copa de uma árvore e disse: "Olha alí, um sabiá do campo!".

Tentativa de diálogo


Por que está quieto, Dante?
*Eu sou quieto.
Por que desnamorou?
*Porque amava sozinho.
E por que dos olhos vermelhos?
*Porque no chão tem poeira.
Não entendi.
*São os rodapés.
Agravou!
*É a tristeza, sabe?
A tristeza no chão?
*Não, na que vem.
De onde ou com quem?
*Com a que desnamorei.
A que amou outrora?
*Na mosca!
Mas ajuíze logo o rumo.
*Rumo de quê?
Da conversa, homem.
*Que foi que não engoliu?
Quase tudo.
*Não tenho bola de cristal.
Dei com os burros n’água outra vez...
*Só pergunte e lhe esclareço, diabos!
Que tem a poeira, com rodapés e os olhos?
*Por que ela vem, mas o amor já se foi.
Vai começar rodear?
*É que me dói olhar.
O que lhe fere os olhos?
*A amada nas retinas, mas dói no peito.
Diga logo de uma vez!
*Tentando despistar a tristeza, eu jogo os olhos nos rodapés.
Mas e a poeira, onde entra nessa história?
*Não lhe disse que tenho olhos de rodapé?
Sim, mas e a poeira, onde entra nisso tudo?
*Entra nos meus olhos, não vê como a cidade anda suja?

Outubro, 2009

Consultório do Dr. Schopenhauer

_E então, Doutor, qual é a má notícia?
_A má notícia é que os exames demonstraram que o senhor está em perfeitas condições de saúde.

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